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Especialista defende contribuição dos tribunais de contas para garantir contratações sustentáveis pelo Poder Público, na Semana do Meio Ambiente do TCE/SC

sex, 07/06/2013 - 17:32
Especialista defende contribuição dos tribunais de contas para garantir contratações sustentáveis pelo Poder Público, na Semana do Meio Ambiente do TCE/SC

“É antijurídica uma contratação [pública] que não prestar serviço ao desenvolvimento sustentável”, disse o professor Juarez Freitas, presidente do Instituto Brasileiro de Altos Estudos de Direito Público (Ibraedp) ao defender a participação dos Tribunais de Contas no controle da gestão ambiental e a contribuição dos órgãos de controle externo na garantia da observância do princípio da sustentabilidade nas licitações públicas, na abertura da Semana do Meio Ambiente do Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE/SC), nesta quinta-feira (6/6). 
 

No auditório do novo edifício-sede do TCE/SC, construído segundo critérios de sustentabilidade, com a adoção de sistemas de captação de água da chuva e de iluminação de baixo consumo de energia, por exemplo, Freitas asseverou que a contratação sustentável não é uma decisão administrativa de pessoas idealistas, românticas ou muito preocupadas com a preservação do meio ambiente. “É uma obrigação legal e constitucional. Não há mais sentido em fazer uma licitação pública no Brasil sem fazer uma avaliação dos custos diretos e indiretos dessa contratação”, reiterou, na palestra sobre sustentabilidade no âmbito das licitações públicas. “Licitação que não for sustentável está viciada”, reafirmou categórico.
 

Autor do livro “Sustentabilidade — Direito ao Futuro”, que apresenta a sustentabilidade como princípio constitucional de caráter vinculante que altera a lógica das licitações e contratações do Poder Público no Brasil, Freitas lembrou do imenso poder de contratação da administração pública e como esse atributo pode impactar numa mudança na cadeia de seus fornecedores, favorecendo o desenvolvimento sustentável e reduzindo os impactos negativos dos processos produtivos e da geração de resíduos.
 

“Os Tribunais de Contas podem e devem realizar o controle preventivo [das licitações] barrando a tese da discricionariedade administrativa [possibilidade garantida pela lei ao agente público para dispor de certa margem de liberdade no exercício da sua competência]”, sustentou o especialista em Direito Público. Na sua opinião, o controle existe para cobrar a vinculação das decisões políticas aos direitos fundamentais previstos no texto constitucional. “Contratação sustentável é o ajuste que leva em consideração os benefícios diretos e indiretos e que são superiores aos custos diretos”, esclareceu.
 

 Para ele, a pergunta sobre licitação sustentável também responde a questão sobre o bem estar inter-relacional a longo prazo. “Não a qualquer preço, não sem projeto”, advertiu, numa alusão à declaração de uma autoridade federal que, recentemente, afirmou ser melhor dispor de uma obra sem projeto, do que não construí-la. “Os Tribunais de Contas têm que nos ajudar a mudar essa perspectiva”, conclamou.
 

Segundo o conferencista, é necessário mudar as métricas do desenvolvimento econômico e ir além da análise dos critérios de menor preço e proposta mais vantajosa quando se trata de avaliar o impacto das licitações públicas. “Temos que sair da ditadura do preço míope e colocar as lentes da sustentabilidade”, afirmou. Para Freitas há outras dimensões que devem ser consideradas como a segurança física e econômica e a qualidade das relações pessoais, que pode se refletir, por exemplo, no tempo que se gasta no trânsito, quando se fala em transporte público e mobilidade urbana. São fatores como esses que o especialista afirma não serem considerados quando se apresentam os resultados da economia por meio dos indicadores oficiais como o PIB (Produto Interno Bruto). “Falar de ‘pibinho’  não significa nada em matéria de desenvolvimento sustentável”, advertiu Juarez Freitas.

 

Contratações sustentáveis

O professor também definiu três momentos fundamentais a serem considerados pelos agentes públicos e órgãos de controle para avaliar as contratações públicas: antes de deflagrar a licitação, a fase de implementação do certame e após a contratação. “A licitação é necessária, é conveniente, é sistemicamente defensável?”. São estas as perguntas sugeridas por Freitas a serem respondidas antes do lançamento do edital, ao considerar o grande número de licitações “ociosas e inúteis” na Administração Pública.
 

“Não há controle de estoques e é quase impossível uma boa gestão”, alertou, ao insistir na relevância do controle preventivo dos Tribunais de Contas.“É muito mais barato intervir nessa fase que antecede a licitação”, observou o advogado, para quem o Direito Administrativo chega muito tarde e, em geral, quando já ocorreu prejuízo. Freitas também apontou a necessidade de ampliar os horizontes da análise das contratações. “O custo da obra não é o custo imediato é o da sua manutenção”, defendeu. “Os TCs estão aqui para dizer que a licitação é proba, decente, economicamente correta: sustentável”, concluiu o advogado.
 

O especialista ainda pediu o apoio dos Tribunais para a causa da sustentabilidade na fase pós-licitação, o que definiu como avaliação retrospectiva. “Os contratos públicos têm que ser fiscalizados [nesta fase] para saber o que os fornecedores estão fazendo, por exemplo, com os resíduos”, explicou. Ao lembrar que um dos pontos críticos do controle se dá depois da obtenção dos licenciamentos ambientais, o especialista defendeu a necessidade da verificação do cumprimento das condicionantes ambientais previstas e a ideia da fiscalização ambiental compartilhada. “O TCE/SC não vai substituir a Fatma [órgão ambiental da governo catarinense] vai ajudar, numa sinergia positiva”, exemplificou. 

 

Dimensões da sustentabilidade

Ao abordar a tese do consultor britânico John Elkington, um dos precursores da responsabilidade social e ambiental nas grandes empresas, que aponta três dimensões (“triple bottom line”) da sustentabilidade — social, ambiental e econômica —, Juarez Freitas destacou que muitos usam esse tripé para reduzir a importância do aspecto ambiental. “O ambiental multiplica por três as outras dimensões da sustentabilidade”, disse. Para o advogado, essas dimensões não podem ser contempladas isoladamente, bem como não se pode opor o social ao ambiental. “A produção de etanol, a partir da cana-de-açúcar, não pode aceitar trabalho escravo”, exemplificou o conferencista.
 

O professor de Direito da UFRGS também defendeu as dimensões  ética e jurídico-política da sustentabilidade e afirmou que elas nos permitem transcender a “tragédia dos comuns”. São aquelas situações causadas quando alguém busca seu benefício individual e causa uma tragédia coletiva ao lidar com bens públicos, como a água e o ar. “Se não houver a fiscalização, um controle de órgãos como os Tribunais de Contas, haverá uma tragédia”, alertou Freitas, que lembrou da degradação da Amazônia e da poluição nas grandes cidades brasileiras, como São Paulo, onde um de cada 10 infartos são causados pela poluição do ar. “Só uma dimensão superior da ética e da moralidade vai solucionar a questão”, reiterou o professor. Na opinião do especialista, é nesse contexto que  reside o desafio dos administradores públicos e dos órgãos de controle.

Quanto o aspecto jurídico-político da sustentabilidade, o professor, ancorado no art. 225 do texto constitucional, considerou que a Carta Federal dilatou o conceito de sujeito de Direito e introduziu o direito fundamental de todos disporem de um meio ambiente ecologicamente equilibrado — considerado um bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida —, impondo ao Poder Público e à coletividade o dever de preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
 

Professor do Curso de Pós-graduação em Gestão da Qualidade para o Meio Ambiente da PUC-RS, Freitas explicou que essa nova ótica altera o conceito romanista de direito fundamental, que privilegia a função sócio-econômica e de equilíbrio econômico. Para ele, decisões mais recentes do Supremo Tribunal Federal, como as que consideram inconstitucionais a “Farra do boi” e as rinhas de galo,  passam  a demonstrar esse novo olhar, que supera a visão do antropocentrismo despótico, onde tudo deve ser feito para atender as necessidades do ser humano.
 

“O princípio da sustentabilidade na Constituição de 88 vai além da dignidade humana”, ponderou o advogado, ao apontar o dispositivo constitucional que proíbe o tratamento cruel de animais por seres humanos. “O fato é de uma relevância imensa porque nos remete a sentir que estamos inseridos na natureza e que temos mais responsabilidade [em preservá-la], até porque somos nós que dispomos do córtex frontal [parte da frente do cérebro onde acontece o planejamento de ações e movimento e o pensamento abstrato] ”, concluiu Freitas.
 

Além da alteração do art. 3º da Lei de licitações (lei nº 8.666/93), pela lei federal 12.349/2010, que inseriu a observância da promoção do desenvolvimento nacional sustentável nas contratações públicas, o advogado também identifica avanços na lei federal nº 12.462/2011, que institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) para licitações e contratos necessários à realização da Copa das Confederações, em 2013, da Copa do Mundo, em 2014, e dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos, em 2016. “Pela primeira vez se menciona a avaliação de custos diretos e indiretos e os impactos causados pelas obras públicas a longo prazo”, ressaltou o professor.

 

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